Propagam-se as cláusulas internacionais com a prescrição de sanções contra países cujo poder constituído for ameaçado por golpe de Estado.
Sem tirar o mérito delas, é de se perguntar até onde são garantia da ordem democrática.
A questão que se levanta é se tal cuidado não deveria ser precedido de outro: a revisão do próprio conceito de democracia, que tem se revelado capenga.
Está aí o exemplo da Venezuela, ao mesmo tempo membro da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) - que sexta-feira se tornou o mais recente bloco de países a adotar o mecanismo - e com entrada no Mercosul dificultada pela constante violação de direitos protagonizada pelo governo Hugo Chávez.
Afinal, até onde vai a autoridade de um chefe de Estado?
Afinal, até onde vai a autoridade de um chefe de Estado?
Até onde a perpetuação de um presidente no poder, sob o custo do cerceamento das oposições e das liberdades de imprensa e de expressão, não é nociva à democracia?
Até onde se pode assentir que propriedades e negócios particulares sejam confiscados da noite para o dia, que leis tenham a validade avalizada ao bel-prazer do chefe do Executivo, que esse poder se dê o direito de cooptar o Congresso e de subjugar o Judiciário?
A Venezuela de Chávez chegou ao cúmulo de sentenciar uma juíza (Maria Lourdes Afíuni) a 30 anos de cadeia pelo "crime" de conceder habeas corpus a cidadão preso sem formação de culpa.
Décadas de ditaduras sangrentas acentuaram a precaução contra o autoritarismo na América Latina.
Décadas de ditaduras sangrentas acentuaram a precaução contra o autoritarismo na América Latina.
Seja na formação de blocos ou em organismos internacionais, cláusulas antigolpe têm se tornado uma constante.
E elas surtem efeito.
A perspectiva do isolamento, num mundo globalizado, tem se mostrado eficiente para desestimular tentativas de ruptura da ordem institucional.
Antes mesmo de recorrer ao mecanismo, foi suficiente uma manifestação explícita da Unasul, com a Carta de Buenos Aires, em outubro, para aplacar levante contra o equatoriano Rafael Correa.
Mas falta coerência na defesa da democracia.
É oportuno lembrar que a democracia, exercida na sua plenitude, é o único regime que garante os direitos da cidadania, como vem demonstrando a história, sendo necessária firme ação em favor das suas prerrogativas.
Somente assim se conseguirá varrer da face do planeta regimes totalitários, que continuam a esmagar os direitos do cidadão.
A liberdade e o respeito às leis são a essência do regime político fundado nos princípios da soberania popular, na divisão equitativa e na independência dos poderes.
A liberdade e o respeito às leis são a essência do regime político fundado nos princípios da soberania popular, na divisão equitativa e na independência dos poderes.
Não pode haver meio-termo.
Admitir regimes mais ou menos democráticos é fazer concessão ao autoritarismo.
Esse é o risco que o subcontinente insiste em correr.
Não apenas no caso Chávez, mas também quando chefes de Estado manifestam simpatia a déspotas como o iraniano Mahmoud Ahmadinejad ou se omitem diante de flagrantes desrespeitos aos direitos humanos em Cuba.
A farsa só terá acabado quando vigorar o repúdio a toda forma de opressão e arbitrariedade.
* Editorial publicado no Diario de Pernambuco de hoje.
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