quarta-feira, 24 de novembro de 2010

DISTRIBUIÇÃO É UM GARGALO DA ÁGUA*

A cena é muito comum no país: pessoas abusam do uso da água, lavando calçadas, passeios e carros. Mesmo sendo o Brasil o grande reservatório de água doce do mundo (11,6% do total disponível, com cada brasileiro, em tese, dispondo de 34 milhões de litros por ano, embora possa levar vida confortável com 2 milhões de litros anuais), tem na distribuição o seu maior gargalo: 80% concentram-se na Amazônia, onde vivem apenas 5% da população do país, com os 20% restantes abastecendo 95% dos brasileiros. Várias cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Goiás e Minas Gerais convivem com oferta anual inferior a 2 milhões de litros por habitante, para uso direto e indireto.

O consumo per capita dobrou em 20 anos, enquanto a disponibilidade de água ficou três vezes menor. Para piorar esse quadro, há muito desperdício: cerca de 30% da água tratada é perdida em vazamentos nas ruas do país - só na Grande São Paulo o desperdício chega a 10 metros cúbicos de água por segundo, o que daria para abastecer cerca de 3 milhões de pessoas diariamente. Sem falar nos hábitos culturais inadequados como deixar a torneira da pia aberta, tomar banhos intermináveis ou usar a água como vassoura.

Segundo o Ministério do Planejamento, perdem-se até 40% dos 10,4 milhões de litros distribuídos anualmente à população do país. Um dos problemas é a concentração urbana, o que prejudica a capacidade de fornecimento de água de boa qualidade. Na América Latina, 30% da população vivem em cidades com mais de 1 milhão de habitantes, aglomerados que geram situações de gerenciamento complexo. São 92 milhões de pessoas sem acesso a água potável (32 milhões na área urbana) e 122 milhões sem esgoto sanitário (56 milhões nas cidades).

Outro grande desafio para a gestão dos recursos hídricos está na agricultura e na pecuária. A atividade agrícola irrigada é a que mais desvia água da natureza, utilizando 70% do volume total extraído do sistema global de rios, lagos e mananciais subterrâneos. Os 30% restantes destinam-se a fins diversos como consumo doméstico, atividade industrial, geração de energia, recreação, abastecimento e outros.

Atualmente, a agricultura irrigada ocupa 17% das terras aráveis do planeta, sendo responsável por 40% da produção mundial de alimentos. Estima-se que até 2025 a atividade agrícola com uso da irrigação vai crescer de 20% a 30%. No Brasil, calcula-se que 50% da água captada para uso é destinada para irrigação, em apenas 5% da área total. Um dos grandes desafios hoje é ampliá-la, adotando técnicas e equipamentos mais eficientes, pois apenas a metade da água irrigada chega às raízes das plantas.

As condições de saneamento básico também continuam muito precárias. Não adianta a pessoa receber água tratada e ter péssimas condições de higiene em função dos resíduos sólidos mal acondicionados, mal coletados ou mal destinados. Mais da metade do esgoto produzido no país não recebe tratamento e é despejado diretamente nos rios, no mar, em lagos e mananciais. Urge a busca de soluções imediatas para evitar o desperdício de água e a contaminação dos mananciais. Para isso, a contribuição de todos é fundamental.





* Editorial publicado no Diario de Pernambuco de hoje.

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