quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

APÓS PERDER REGIÃO LESTE, DITADOR REFORÇA TROPAS NO OESTE DA LÍBIA *

Após perder o controle da região leste da Líbia - onde está a cidade de Tobruk e grande parte dos campos produtores de petróleo - o ditador Muammar Gaddafi enviou mais tropas à capital Trípoli e à região oeste do país, em meio a relatos da oposição de que ao menos uma cidade nesta parte da Líbia já estaria em seu controle.

Mais de 640 já morreram no país, de acordo com grupos de direitos humanos.

Em Trípoli moradores indicaram que a presença de membros de milícias e mercenários estrangeiros contratados pelo governo aumentou consideravelmente e que as trocas de tiros nas ruas têm ficado mais violentas.

"Muitas pessoas estão com medo de deixar suas casas em Trípoli já que atiradores de milícias pró-Gaddafi estão nas ruas ameaçando qualquer um que se junte em grupos", disse o tunisiano Marwan Mohammed, logo após cruzar a fronteira com a Tunísia.

As manobras de Gaddafi, que chegam horas após dois pilotos terem se ejetado de um jato de guerra que caiu em Benghazi, são vistas pela mídia internacional como "desesperadas" e indicam que a perda de controle do país tende a aumentar.

A oposição afirma ter tomado o controle de Misrata, uma das maiores cidades da parte oeste da Líbia onde o ditador já não teria mais o poder.

Intensos confrontos também já foram registrados em Sabratha, a oeste de Trípoli, onde soldados e mercenários tentam a todo custo retirar os manifestantes que cercaram prédios do governo.

O ditador conclamou seus defensores para uma grande manifestação em seu apoio na praça Verde, em Trípoli, mas menos de 150 pessoas apareceram, carregando seu retrato e a bandeira da Líbia.

Mais cedo um avião das Forças Aéreas da Líbia caiu perto de Benghazi (leste) depois que sua tripulação se recusou a obedecer as ordens de bombardear a cidade e se ejetou da aeronave - uma Sukhoi-22 de fabricação russa -, caindo em segurança em terra firme com a ajuda de paraquedas.

As informações são do jornal líbio "Quryna", que cita uma fonte militar.

De acordo com um coronel de uma base aérea perto de Benghazi, os tripulantes seriam o capitão Attia Abdel Salem al Abdali e seu número dois, Ali Omar Gaddafi.

Ali Omar Gaddafi é da mesma tribo do ditador Muammar Gaddafi, os Gadhadhfa, disse Farag Al Maghrabi, morador que viu os pilotos e os destroços do jato.

Al Maghrabi disse que a aeronave caiu em uma área deserta nos arredores do porto de Breqa, sem causar maiores danos.

A recusa dos militares mostra que o ditador Muammar Gaddafi está cada vez mais isolado até mesmo dentro das suas Forçar Armadas.

Mais cedo, oficiais do Exército líbio na zona de Al Jabal al Akhdar, no nordeste do país, anunciaram que já fazem parte da "revolução do povo", em um vídeo divulgado pelas emissoras de televisão árabes Al Jazeera e Al Arabiya.

"Nós, os oficiais e os soldados das forças armadas na zona de Al Jabal al Akhdar, anunciamos nossa união total à revolução popular", disse um porta-voz militar das Forças Armadas líbias na região.

O porta-voz anunciou ainda o compromisso desses militares em trabalhar para proteger as instalações públicas e privadas na região.

Na véspera, o ministro do Interior líbio e general do Exército, Abdul Fatah Yunis, pediu demissão e incentivou as Forças Armadas a se unirem ao povo em sua luta por legítimas reivindicações, informou a Al Jazeera.

Ao menos 640 pessoas morreram na Líbia nos protestos contra o regime do ditador Muammar Gaddafi desde 14 de fevereiro, anunciou nesta quarta-feira a Federação Internacional para os Direitos Humanos (FIDH).

O número representa mais que o dobro do balanço oficial do governo líbio de 300 mortos.

A FIDH menciona 275 mortos em Trípoli e 230 na cidade de Benghazi, epicentro dos protestos.

Intensos tiroteios foram registrados nesta quarta-feira em Trípoli, enquanto forças leais a Gaddafi apertam o cerco na capital do país.

Manifestantes antigoverno também dizem terem assumido o controle de diversas cidades, um dia depois de o mandatário ter afirmado, em discurso, que morrerá em solo líbio como "mártir".

A indignação internacional aumentou um dia depois de o ditador ter prometido defender seu regime e pedir para partidários que reprimam os manifestantes de oposição.

O governo italiano revelou nesta quarta-feira o temor de que a queda do ditador líbio Muammar Gaddafi possa estimular a partida de milhares de imigrantes ilegais rumo à Itália e outros países europeus como a Grécia.

Já a Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas (Frontex) estima que entre 500 mil e 1,5 milhão de líbios possam pedir refúgio do outro lado do Mediterrâneo.

O chanceler da Itália Franco Frattini alertou em entrevista ao jornal "Corriere della Sera" que a fuga de líbios pode se converter num "êxodo bíblico", sendo uma onda até dez vezes maior do que a crise registrada em 1997 quando refugiados da Albânia migraram rumo ao país.

"Na Líbia, um terço da população não é originária do país, mas subsaariana. Estamos falando de 2,5 milhões de pessoas que, no caso da queda do sistema do país, escaparão porque ficarão sem trabalho. Nem todos virão à Itália. Grécia está muito mais perto de Cirenaica e Benghazi", avaliou o chanceler, acrescentando que a parte leste do país é "terra de ninguém".

"Na Cirenaica, como se sabe, existem tribos e nós não temos ideia de quem são", revelou, destacando que o que se sabe deles é que são perigosos e contam com integrantes da rede terrorista Al Qaeda, e que por isso no fim de 2006 a Itália decidiu fechar seu consulado na região.

A agência da União Europeia (UE) encarregada de guardar as fronteiras do bloco manifestou preocupação com o êxodo de imigrantes ilegais que pode ser ocasionado em meio à crise no norte da África.

"Trata-se de pessoas de origem subsaariana que trabalham na Líbia e o norte da África" e que "se dirigiriam principalmente à Itália, Malta e Grécia", alertou a Frontex em comunicado.

Os ministros de Interior da UE se reunirão na quinta-feira em Bruxelas para debater pela primeira vez as consequências na imigração das revoltas do norte da África.

Além disso, a Comissão Europeia, Frontex e o governo italiano informarão ao resto dos estados-membros sobre a operação Hermes em Lampedusa.

A agência dedica atualmente a maior parte de sua capacidade nessa operação após as revoltas na Tunísia chegaram ao redor de 5,5 mil imigrantes.

"Será a primeira oportunidade que terão os 27 países integrantes da UE de discutir em conselho a crise da imigração e avaliar os seguintes passos a serem dados", informou um porta-voz da Presidência húngara que atualmente comanda o bloco.

Após a queda do ditador da Tunísia Zine el Abidine Ben Ali, na metade de janeiro, mais de 5.000 imigrantes já tentaram entrar na ilha de Lampedusa, na Itália, e barcos com egípcios também já foram apreendidos.

A Itália, porta de entrada por questão geográfica, quer dividir a responsabilidade com o resto da Europa e já pediu a criação de fundo de 100 milhões de euros para cuidar do problema.

O país alega que esses imigrantes não desejam ficar na Itália, mas ir para a França, onde têm família.

Há também a facilidade da língua: o país foi colônia francesa, e a maioria dos tunisianos fala o idioma.

Acordo entre os países da União Europeia determina que imigrantes em busca de asilo devem ficar no país a que chegaram até a solução de seu caso.


* Publicado no UOL às 17:36 hs.

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